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Educação
16 set

Regra de celular esbarra em resistência de pais e alunos e falta de estrutura escolar

Regra de celular esbarra em resistência de pais e alunos e falta de estrutura escolar

A lei que proíbe o uso de celulares em escolas brasileiras, sancionada no início deste ano, enfrenta resistência de pais e alunos, além de revelar a fragilidade da infraestrutura escolar para sua implementação. A medida, que restringe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis por estudantes em sala de aula, recreio e intervalos, visa combater a distração, mas esbarra em realidades complexas do cotidiano escolar e social.

Válida para todas as etapas da educação básica, a decisão tem exceções como o uso para fins estritamente pedagógicos ou didáticos, seguindo orientação dos profissionais de educação. Para o gestor escolar Fernando Francelino, contudo, ainda falta infraestrutura adequada para a implementação da lei.

Diretor da Escola Estadual de Tempo Integral Winston Churchill, em Natal, ele observa que a norma para não usar celular em sala já existia, mas agora a restrição é ainda maior. Ele opina que a restrição é “inconcebível”, porque os estudantes têm os equipamentos eletrônicos como parte de seu ciclo social.

Ao comentar a lei, o presidente Lula (PT) defendeu a proposta e exemplificou: “Imagina uma professora dando aula e, quando ela olha para os alunos, está cada um olhando para o celular, um tá na China, outro tá na Suécia, outro tá no Japão, outro está em outro estado conversando com gente que não tem nada a ver com a aula que ela está recebendo”, disse.

Resistência e dificuldade de adaptação

A medida enfrenta resistência até dos pais de alunos, diz Francelino, pois “[o celular] é uma forma de eles manterem contato com os filhos”. A norma amplia a restrição ao uso dos equipamentos em contexto escolar e traz à tona uma série de questões práticas.

“É infrutífero imaginar discutir qualquer atividade pedagógica, qualquer desenvolvimento cognitivo e educacional dos meninos sem contar com a ferramenta que faz parte do dia a dia deles de uma forma muito mais intensa e atrelada do que o que a gente pode trabalhar dentro da sala de aula com os recursos que nós temos”, afirma Francelino.

A falta de infraestrutura adequada é o ponto mais crítico para a aplicação da lei, segundo Francelino. Ele aponta a ausência de dispositivos de apoio estatal para as escolas, como locais seguros para o armazenamento dos celulares recolhidos. Essa situação sobrecarrega os professores, que acabam sendo designados como “garantidores” de uma regra de difícil cumprimento, sem os recursos necessários.

Telefone é “dispersivo”

Por outro lado, o uso inadequado do telefone em sala de aula é reconhecido como prejudicial. “O telefone é um dispersivo sensacional. Neste quesito, o ponto negativo até justifica a necessidade de controle. Mas como controla? Quem controla? Por quais meios? Quais as garantias?”, Francelino questiona.

A questão ganha contornos específicos nas escolas de tempo integral, que atendem adolescentes em jornada estendida e com atividades para além das disciplinas tradicionais. “A educação em tempo integral preenche o dia dos jovens, mas ela se dispõe a ser uma educação que abranja um pouco mais do que somente o científico.”

Nesse contexto, o celular é apontado como um recurso importante também nos momentos de intervalo, como no horário de almoço. “O horário do almoço é um intervalo que tem uma hora e vinte de duração, que é para dar tempo de os estudantes almoçarem e descansarem. Neste período, eles devem ficar dentro da escola”.

Limitações de infraestrutura

As limitações de infraestrutura das escolas também são citadas como um obstáculo para oferecer alternativas ao celular nesses períodos. “Não conseguimos garantir todos os recursos que acreditamos que devessem existir nas escolas, como espaços mais amplos ou melhor equipados de tecnologia e de jogos de um modo geral. Não são todas as escolas que conseguem dispor de alguma coisa [que sirva como alternativa ao celular]”.

A visão sobre o papel do celular na aprendizagem também está presente no debate. “É necessário o controle para que eles não se percam da aula ao mexer no telefone, mas ao mesmo tempo não se pode desmerecer que o telefone é uma ferramenta que faz parte do dia a dia deles”, conclui o educador.

A reportagem perguntou ao gestor escolar se é possível analisar o impacto da medida no desempenho escolar dos alunos, por exemplo, alguma melhoria nas notas. Ele informou que essa avaliação ainda não é possível, uma vez que a medida ainda está em vias de implementação, “sem uma orientação clara”.

Enquanto a implementação da lei no contexto geral ainda carece de dados claros sobre impacto no desempenho escolar, o exemplo do Rio de Janeiro (RJ), onde a medida foi aplicada um ano antes de virar lei federal, oferece uma perspectiva promissora.

Após um ano da aplicação da medida, o município registrou avanços mensuráveis no desempenho de alunos do ensino fundamental em matemática (25,7%) e português (13,5%), de acordo com a Agência Brasil. Esses resultados, validados por métodos estatísticos que isolaram outros fatores, sugerem que a proibição, quando apoiada por uma estrutura adequada, pode gerar benefícios educacionais significativos.

Foto: José Aldenir/Agora RN

Agora RN

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