ICMS de 20% entra em vigor dia 20 e deve impactar bolso do consumidor

Setor produtivo afirma que a carga tributária deverá exercer uma pressão ainda maior na elevação dos preços de vários itens | Foto: Anderson Régis

A partir da próxima quinta-feira (20) a alíquota modal do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) subirá dos atuais 18% para 20%, conforme mudança estabelecida pelo Decreto nº 34.284, de dezembro de 2024. O reajuste trará impactos para o bolso dos consumidores e afetará, principalmente, setores como o de energia elétrica e combustíveis. Entidades produtivas do RN seguem demonstrando preocupação com os reflexos do reajuste, que pode desencadear redução de consumo, além de perda de competitividade e de investimentos.

Roberto Serquiz, presidente da Federação das Indústrias do RN (Fiern), chama atenção para a elevação de custos nas empresas. “Paralelo a isso, há um impacto na renda popular. A dimensão vai depender não somente da nossa realidade, como também de um cenário nacional, como o câmbio, a taxa Selic e a inflação. Mas, historicamente, nós sabemos que aumento de imposto penaliza o investimento, fere a capacidade de compra das pessoas, ou seja, gera todo um desequilíbrio na economia”, fala Serquiz. Os efeitos na competitividade do RN também são uma preocupação da Federação.

“O aumento nos traz preocupação porque o RN já é o último estado do Nordeste em competitividade e o 24º do Brasil, de acordo com o ranking anual do Centro de Liderança Público. Isso ocorre por conta da falta de solidez fiscal e baixa capacidade de investimentos do Estado, problema para o qual o aumento de impostos não pode se vislumbrar como única solução”, aponta Serquiz.

As preocupações da Federação da Agricultura, Pecuária e Pesca do Rio Grande do Norte (Faern) são semelhantes. Para José Vieira, presidente da Faern, os impactos serão significativos tanto para os consumidores quanto para o setor agropecuário. “Para os consumidores resultará em preços mais elevados em diversos produtos e serviços. Isso tende a reduzir o poder de compra das famílias, especialmente as de baixa renda. O aumento generalizado dos preços pode contribuir para elevar a inflação, o que, por sua vez, pode levar a um ciclo vicioso de aumento de preços e redução do poder de compra e do consumo”, observou Vieira.

Para o agro, segundo o presidente da Faern, muitos insumos e produtos utilizados na produção estão sujeitos ao imposto, o que pode encarecer a produção, com custos que tendem a ser repassados aos consumidores na forma de preços mais altos. “O efeito cascata se dará, então, com aumento de preços, redução de consumo, diminuição da demanda e da produção e um volume menor de vendas, que pressiona a rentabilidade dos produtores e pode levar à queda dos investimentos no campo”, afirma.

Por meio de nota, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio-RN) disse que acompanhará com atenção os efeitos da mudança. “Sabemos que a elevação da carga tributária pode exercer uma pressão ainda maior para a elevação dos preços de vários itens, se somando ao atual quadro inflacionário. Considerando ainda o cenário de juros elevados observados hoje, esse processo poderá ter repercussões negativas para a atividade econômica do estado”, pontuou a Federação.

Combustíveis e energia serão os mais afetados

Energia elétrica e combustíveis – os maiores responsáveis pela arrecadação estadual – serão os mais afetados com a alta da alíquota do ICMS para 20%, uma vez que não existem incentivos fiscais para ambos, segundo o economista Thales Penha. No caso dos combustíveis, além do reajuste do imposto, também deve ser considerada a regulação de preços por parte da Petrobras.

Para os demais setores, é mais difícil de medir os reflexos. Isso porque, de acordo com o especialista, o RN é um estado altamente importador, e os impactos, nesse aspecto, dependem muito mais do ICMS de outras unidades federativas. Os incentivos fiscais também interferem nos preços que chegam ao consumidor final. “Os atacadistas do Rio Grande do Norte não pagam tarifa cheia – para o segmento, a alíquota de ICMS é de 7%, e não será alterada com o reajuste. O Proedi [Programa de Estímulo ao Desenvolvimento Industrial do RN] continuará com os mesmos benefícios fiscais para a indústria. O varejo, que não tem os incentivos do atacado, também vai sentir a alta”, analisa Penha.

O economista avalia que o aumento da alíquota, apesar de ser uma decisão que gera desgaste político, é importante para o equilíbrio das contas públicas.

“Existe um problema grande que é a folha de pagamento. Há 15 anos o Estado paga acima do Limite de Responsabilidade Fiscal. Então, o ICMS é um instrumento que o Governo tem, porque não dá para reduzir salários. Para algumas categorias, como professores e enfermagem, é preciso obedecer, inclusive, ao piso estabelecido para os profissionais, conforme legislação nacional”, afirma o economista.

Para a população, a mudança gera insatisfação, uma vez que o aumento se soma à inflação, especialmente, a dos alimentos, que corrói o poder de compra dos potiguares. O motorista de transporte por aplicativo, Lúcio Jerônimo, de 43 anos, conta que precisou mudar de hábitos para reduzir o peso dos custos no orçamento. O aumento do ICMS, com impacto principalmente nos combustíveis, portanto, chega em uma péssima hora. “Lá em casa, nós temos dois carros, mas o que uso para as corridas, abasteço com gás, que compensa. O outro, que a gente usa gasolina, fica com minha esposa, para ir e voltar do trabalho apenas”, conta.

“Fiz as contas e, se eu rodasse com o carro a gasolina, teria um gasto diário de cerca de R$ 150 com combustível. Com o veículo a gás, esse gasto diário reduz para R$ 90 ou R$ 100, no máximo. Já em relação à alimentação, fiz algumas alterações. Antes, eu comprava quatro pacotes de café para o mês. Agora, compro somente um. Na maioria das vezes, prefiro tomar café na rua, que acaba sendo mais econômico. Então, ter que lidar com mais aumentos é complicado”, completa o motorista.

Do mesmo modo que Lúcio, o vendedor José Leonardo Santos, de 28 anos, considera que está cada vez mais difícil encaixar o orçamento nas compras do dia a dia. “Alimentação, água, luz, gás de cozinha, tudo já está muito caro. Eu, particularmente, tenho preferido comer fora do que fazer a feira para comer em casa, então, essa alta do ICMS é um absurdo”, declara o vendedor.

Jordan Fernandes, de 26 anos, afirma que o aumento afeta os consumidores e enfraquece a economia. “Como consumidor e como varejista, eu me preocupo, porque, no patamar atual, nós já convivemos com preços altos. Acredito que o melhor seria o movimento contrário, de redução de impostos, porque estamos todos sofrendo com a inflação”, indica Fernandes, que é locutor em uma loja no Alecrim.

Entidades são contra aumento do ICMS

As entidades do setor produtivo ouvidas pela reportagem reafirmaram o posicionamento contrário ao reajuste da alíquota modal do ICMS. “A Faern entende que a medida impacta negativamente toda a sociedade”, sublinhou José Vieira, presidente da Federação.

Em nota, a Fecomércio esclareceu que reforça o compromisso com a busca de alternativas que atenuem os efeitos do ajuste fiscal sobre o poder de compra dos potiguares e o ambiente de negócios, mas sem penalizar comércio e consumidores.

“Entendemos que a implementação de reformas estruturantes e o estímulo ao setor produtivo são caminhos essenciais para garantir a sustentabilidade financeira do Estado e mitigar os desafios impostos pelo cenário inflacionário atual, preservando a competitividade dos setores de comércio e serviços”, destacou a Fecomércio-RN.

A Fiern frisa que a alíquota menor seria um diferencial para a competitividade do RN. “Defendemos, lá atrás, a permanência dos 18%, para que o Estado pudesse ter um diferencial competitivo em função da fragilidade da nossa infraestrutura e até mesmo do ambiente de negócios. Até porque se tinha, àquela altura, uma arrecadação relativamente estável e um potencial de crescimento da arrecadação”, afirma o presidente da Fiern, Roberto Serquiz.

Com o reajuste de 2 pontos percentuais na alíquota modal, o Governo do Estado estima arrecadar R$ 7,4 bilhões com o imposto em 2025, o que representaria 32,35% da receita própria estadual. Além disso, 25% do montante arrecadado deve ser destinado aos municípios potiguares.

A recuperação da arrecadação do ICMS é considerada essencial pelo governo para equilibrar as contas públicas e garantir a revisão salarial anual aprovada no ano passado. O governo espera recompor gradualmente a despesa com pessoal, adequando-a à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Conforme o Relatório de Gestão Fiscal (RGF) publicado em 30 de janeiro no Diário Oficial do Estado (DOE), a folha (de ativos e inativos) já compromete 57,56% da Receita Corrente Líquida (RCL) do Estado). Esse percentual supera em 8,56 pontos o limite máximo de 49% estabelecido pela LRF, o que coloca o estado em uma situação de alerta.

Em reportagem publicada em fevereiro pela Tribuna do Norte, o secretário de Administração do Estado, Pedro Lopes, afirmou que o reajuste, que beneficia 65.828 servidores, representará um desembolso mensal de R$ 39 milhões.

Tribuna do Norte

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